Ushuaia, a terra do fim do mundo

   Estivemos pela segunda vez em Ushuaia, a terra do fim do mundo, como dizem. A cidade cresceu muito, desde que lá aportamos, em 2006. E é muito bonita, com as montanhas geladas ao fundo, um clima sempre frio, o céu muito azul, no verão, e um mar lindo, quando sereno. É a cidade mais austral do continente americano, por isso, se diz do fim do mundo, mas a última é a pequena Porto William, pertencente ao Chile, mais ao sul ainda. De Ushuaia (os argentinos pronunciam Usuaia) , pode-se pegar um barco e fazer um passeio de bate e volta a Porto Williams, na entrada do Canal de Beagle. Os aventureiros adoram.

   Ushuaia está na moda. Alguns até a consideram “a cidade mais bonita do mundo”. Exagero! Localizada em uma colina íngreme e sujeita a ventos muito fortes, cidade está espremida entre a Cordilheira Martial e o Estreito de Beagle. Está a apenas 6m. acima do nível do mar e pode ser inundada a qualquer momento pelo derretimento dos glaciares fruto do aquecimento global. Ushuaia é a base dos navios de cruzeiro que vão à Antártica e dos pequenos passeios às ilhas repletas de pinguins no Canal de Beagle. Os argentinos a consideram a capital das Malvinas, nome que dão às Falklands situadas a 400 km dali.

   Há muito o que se fazer em Ushuaia, fora da cidade, minúscula e inadequada para caminhar, exceto a pequena orla. A segunda rua acima da beira-mar é a mais comercial, com lojas de suvenires, bares e restaurantes, mas a maioria dos turistas que vão a Ushuaia procuram a sua beleza natural, que são muitas. Sua região foi habitada pelo ser humano há milhares de anos, e foi colonizada por europeus a partir de meados do século XIX, que instalaram missões para catequização dos indígenas. Esses, porém, desapareceram sob o impacto da aculturação e da devastação causada por epidemias trazidas pelos colonizadores. A cidade cresceu lentamente ao longo da primeira metade do século XX, organizando-se em torno da instalação de um grande presídio, que trouxe muitos funcionários administrativos e atraiu novos colonos, mas também fez com que se formasse uma impressão sombria sobre o local. A partir da metade do século XX, o presídio foi extinto, a cultura se diversificou e o progresso se deu mais rápido, com a instalação de diversos serviços, a melhoria na infraestrutura urbana e a criação de incentivos governamentais para a fixação de novos residentes.

   Os principais pontos de interesse turístico em Ushuaia são as atividades ao ar livre, os passeios, os museus e a generosidade da natureza. Na cidade, aproveite para subir o Glaciar Martial, com uma vista lindíssima, e fazer um passeio para conhecer a Pinguinera, local para onde os pinguins migram no verão. Para conhecer as redondezas, pode-se fazer um passeio que leve aos lagos Fagnano e Escondido; para entender melhor a história desse curioso lugar, é indispensável uma visita ao Museu Marítimo e ao presídio. Recomenda-se, também, uma excursão ao Parque Nacional Terra do Fogo com um passeio no trem do presídio; a trilha da laguna Esmeralda e um passeio de barco pelo Canal de Beagle para ver pinguins. Na cidade, pode-se fazer um city-tour de uma hora num antigo ônibus estilo inglês e, depois, comer um delicioso cordeiro patagônico ou centolla  em algum dos restaurantes locais.   

Punta Arenas, porta do Estreito de Magalhães

circum-navegação do planeta. Na verdade, a segunda, pois, na segunda vez em que estivemos lá, em 2016,  o tempo fechou e tivemos de voltar às pressas para o navio, para nossa sorte, pois cerca de dois mil passageiros tinham ido fazer passeios e ficaram em terra até poderem regressar. Um sufoco! A história daquele Canal é uma saga de muitos sofrimentos. Não à toa, o principal ponto de atração da cidade é o cemitério. Como muitos morreram nessa tentativa de travessia, ficaram ali enterrados em suntuosos túmulos patrocinados por ricos familiares. Além deles, a principal atração do cemitério é a sepultura humilde de um indígena, tido pelos locais como milagreiro.

   A travessia do Canal é algo de espetacular! Montanhas com gelo de um lado e outro, por entre a chamada Terra do Fogo, pois, no passado, os povos originários sinalizavam a passagem com fogueiras, o que chamou a atenção dos primeiros navegadores. Por muitos anos, tentou-se a passagem pelos oceanos do ocidente para o oriente, em busca das almejadas especiarias, até que Vasco da Gama a descobriu, em 1498, contornando o sul da África. Depois, foi a vez de Fernão de Magalhães, outro português. Em busca de uma nova rota para chegar às Índias, terras das preciosas especiarias, Magalhães, a serviço da Espanha, traçou um plano para fazer essa viagem pelo Oeste, atravessando as Américas, em 1519. Depois de muitos percalços, ele descobriu que era possível acessar o Oceano Pacífico passando por um Canal, o atualmente chamado Estreito de Magalhães, batizado em sua homenagem por essa façanha. Mesmo sem conseguir sobreviver à aventura, pois foi morto nas Filipinas, pouco tempo depois, o explorador português ficou conhecido por ser o idealizador da primeira circum-navegação registrada, que também é chamada de a primeira “volta ao mundo” conhecida.

   Há muito o que se fazer em Punta Arenas, além de passear no cemitério. Recomendo a visita ao Museu dos Salesianos, uma excelente mostra do trabalho feito por eles de recolha de objetos dos povos originários e da fauna e da flora patagônicas. Os Salesianos estão lá há mais de cem anos, cristianizaram os antigos moradores da reunião e preservaram um tanto de sua memória. Após a visita ao Museu, que custa 10 US$, pode-se fazer visita a pinguins em ilhas do canal, a estâncias, onde se pratica a criação de ovelhas, ou a um antigo forte. Ou então, ficar passeando pela cidade, após três dias balançando no mar nada Pacífico, parar num bom restaurante local e saborear a excelente comida patagônica, à base de carnes ou de pescados, acompanhada dos maravilhosos vinhos chilenos, muito baratos ali. Torcer pra pegar um bom tempo e poder continuar a viagem, em paz. Naquela região, o tempo muda a todo instante, e o fator sorte é essencial. Salud!

Em Stanley, nas Falklands

Pela segunda vez, retorno a Porto Stanley, capital das Falklands, arquipélago inglês situado entre a Antártica e o continente Sul-americano, bem mais perto da Argentina do que da Inglaterra, país que a ocupa desde o século0 XIX, há uns duzentos anos. Os primeiros colonizadores foram os franceses, que ali chegaram em 1764, mas foram os ingleses que instalaram em Porto Stanley, desde 1845, um local para reparar navios que atravessavam o Estreito de Magalhães, durante a corrida do ouro, na Califórnia. Os argentinos sempre a chamaram de Malvinas e reivindicam a sua propriedade, mas nunca estiveram ali, permanentemente. As Falklands são inglesas, sem sombra de dúvida. E é assim que é vista, uma pequena  vila inglesa, no extremo sul do planeta, um lugar inóspito, sujeito a tormentas e a mudanças climáticas buscas, um vento frio do cão, que, mesmo no verão, quando fomos, o termômetro marcando 8º C, um vento frio dói até na alma.

   Diferente da primeira vez, Stanley está bem mais preparada para o turismo. Há centro de informações, ônibus indo e vindo para visitar pinguins, supermercado bem sortido, lojas boas de artesanato, bares e restaurantes poucos, mas funcionando, e o Museu muito mais bem organizado. Hoje, se pode fazer passeios para visitar os campos de batalha da guerra de 1982 e as colônias de pinguim, sem riscos de ser explodido por uma mina. Parece que a ilha está limpa, depois de um longo trabalho de busca dessas máquinas mortíferas.

   A ilha possui apenas três mil habitantes, muito educados, como é comum entre descendentes de ingleses; no entanto, é moradia para milhares de ovelhas, pinguins, focas e leões-marinhos. Em pouco tempo, pode-se fazer um passeio pela pequena Stanley, cujas principais atrações são a Catedral anglicana, a mais ao sul do planeta, com seu arco de ossos de baleia; a igreja católica e o museu histórico Dockyard, com bela exposição da história da cidade mas, e principalmente, com importantes documentos, fotos e objetos da Guerra de 1982 contra os argentinos. A Inglaterra venceu o conflito em apenas 76 dias e ali se encontra o memorial com a relação dos mortos ingleses, um terço do contingente argentino. Nas Falklands, há um cemitério com centenas de soldados argentinos mortos, jovens que perderam a vida levados pela estupidez da junta militar no poder. Há de se tomar cuidado para que a história não se repita, com um desequilibrado mental no poder.

   Creio que a maior atração para os que vão a Stanley, seja visitar os pinguins. Os mais fáceis de ver são os da Bluff Cove, aonde se pode ir de ônibus, pagando 20US$, ida e volta. Há um pequeno observatório e de lá caminha-se pela praia um bom pedaço para se chegar até a colônia. Recomenda-se roupa e sapatos adequados para caminhar na areia. Há outros pontos de observação de pinguins mais distantes, em Rockhopper e Volunteer point, aonde só se chega em veículo 4 x 4, não recomendável para idosos ou para os que têm qualquer problema de locomoção ou de coluna. Se quiser ver os leões-marinhos, deverá ir até o Kelp Point, a 1,5 hora de Stanley. Para os aficcionados por guerra, há passeios aos campos de batalha, onde se pode ver os bunkers, buracos de raposa, roupas descartadas, munições não usadas e minas não explodidas. Prefiro o que vi no museu, e já foi suficiente para comprovar o quanto são estúpidas e insensatas todas as guerras.

Pela segunda vez, retorno a Porto Stanley, capital das Falklands, arquipélago inglês situado entre a Antártica e o continente Sul-americano, bem mais perto da Argentina do que da Inglaterra, país que a ocupa desde o século0 XIX, há uns duzentos anos. Os primeiros colonizadores foram os franceses, que ali chegaram em 1764, mas foram os ingleses que instalaram em Porto Stanley, desde 1845, um local para reparar navios que atravessavam o Estreito de Magalhães, durante a corrida do ouro, na Califórnia. Os argentinos sempre a chamaram de Malvinas e reivindicam a sua propriedade, mas nunca estiveram ali, permanentemente. As Falklands são inglesas, sem sombra de dúvida. E é assim que é vista, uma pequena  vila inglesa, no extremo sul do planeta, um lugar inóspito, sujeito a tormentas e a mudanças climáticas buscas, um vento frio do cão, que, mesmo no verão, quando fomos, o termômetro marcando 8º C, um vento frio dói até na alma.

   Diferente da primeira vez, Stanley está bem mais preparada para o turismo. Há centro de informações, ônibus indo e vindo para visitar pinguins, supermercado bem sortido, lojas boas de artesanato, bares e restaurantes poucos, mas funcionando, e o Museu muito mais bem organizado. Hoje, se pode fazer passeios para visitar os campos de batalha da guerra de 1982 e as colônias de pinguim, sem riscos de ser explodido por uma mina. Parece que a ilha está limpa, depois de um longo trabalho de busca dessas máquinas mortíferas.

   A ilha possui apenas três mil habitantes, muito educados, como é comum entre descendentes de ingleses; no entanto, é moradia para milhares de ovelhas, pinguins, focas e leões-marinhos. Em pouco tempo, pode-se fazer um passeio pela pequena Stanley, cujas principais atrações são a Catedral anglicana, a mais ao sul do planeta, com seu arco de ossos de baleia; a igreja católica e o museu histórico Dockyard, com bela exposição da história da cidade mas, e principalmente, com importantes documentos, fotos e objetos da Guerra de 1982 contra os argentinos. A Inglaterra venceu o conflito em apenas 76 dias e ali se encontra o memorial com a relação dos mortos ingleses, um terço do contingente argentino. Nas Falklands, há um cemitério com centenas de soldados argentinos mortos, jovens que perderam a vida levados pela estupidez da junta militar no poder. Há de se tomar cuidado para que a história não se repita, com um desequilibrado mental no poder.

   Creio que a maior atração para os que vão a Stanley, seja visitar os pinguins. Os mais fáceis de ver são os da Bluff Cove, aonde se pode ir de ônibus, pagando 20US$, ida e volta. Há um pequeno observatório e de lá caminha-se pela praia um bom pedaço para se chegar até a colônia. Recomenda-se roupa e sapatos adequados para caminhar na areia. Há outros pontos de observação de pinguins mais distantes, em Rockhopper e Volunteer point, aonde só se chega em veículo 4 x 4, não recomendável para idosos ou para os que têm qualquer problema de locomoção ou de coluna. Se quiser ver os leões-marinhos, deverá ir até o Kelp Point, a 1,5 hora de Stanley. Para os aficcionados por guerra, há passeios aos campos de batalha, onde se pode ver os bunkers, buracos de raposa, roupas descartadas, munições não usadas e minas não explodidas. Prefiro o que vi no museu, e já foi suficiente para comprovar o quanto são estúpidas e insensatas todas as guerras.

Antártica, reserva natural da humanidade

Acabo de fazer uma viagem incrível ao único continente a que não tinha visitado, a Antártica, ou Antártida, um dos seis continentes que formam o planeta Terra. Prefiro o primeiro nome, por estar em oposição ao Ártico, que visitei no ano passado. Estive num cruzeiro que saiu de Ushuaia, passou pelo terrível canal Drake, onde se encontram as águas dos Oceanos Atlântico e Pacífico e o movimento das placas tectônicas provoca ondas enormes e um mar muito agitado. Nossa primeira paisagem da Antártica, mal avistada, foi  o iceberg A23a, considerado o maior do mundo; depois, passamos pela ilha Elefante e nos dirigimos à Baía do Almirantado, onde passamos toda a manhã.  Ela possui cerca de 8km na costa sudeste da Ilha do Rei George, a cerca de 16 km das ilhas Shetland do Sul. Levantei cedo e fui contemplar o sol nascer. Estava um dia lindo, um frio gostoso de -3°C e uma neve muito fina. Sobre nós, voavam pássaros predadores, os mandriões, e, no mar, avistamos baleias dormindo na superfície, alguns golfinhos e leões-marinhos. Um espetáculo! Nessa baía, se encontram duas estações científicas de pesquisa, a polonesa e a brasileira, a Comandante Ferraz.

   Dali, nos dirigimos à Baía Charlote e à Baía Guilhermina, por entre montanhas de gelo de um lado a outro do caminho e inúmeros icebergs, alguns maiores que os maiores edifícios de nossas cidades. O dia estava esplêndido, um gostoso sol de verão antártico e uma temperatura em torno de 0°C. Pelo caminho, víamos baleias, golfinhos e algumas aves sobrevoando o navio. No entanto, a presença, cada vez maior, de navios de cruzeiro e de barcos de pesca acaba trazendo consigo o maior perigo à vida marinha: a poluição dos plásticos. Por mais cuidado que se tenha, a contaminação de resíduos não biodegradáveis também chegou à Antártica. Pesquisas estão sendo feitas, mostrando como o plástico, apesar das fortes correntes marítimas, também chegou ao continente mais deserto do mundo e afeta todo o ecossistema antártico.

   No dia seguinte, passamos pelo Canal Neumayer e chegamos a Port Lockroy, onde alguns pesquisadores vieram a bordo para vender suvenires. De lá, se pode mandar postais para o resto do mundo, o último lugar do planeta onde se pode fazer isso, mas alguns poucos privilegiados conseguiram comprar selos, no navio, para essa rara experiência. Passamos o resto do dia, contemplando aquela paisagem maravilhosa: de um lado, montanhas de até quatro mil metros de altura, do outro, ilhas, baías, icebergs, toda uma fauna marinha, hoje, preservada. Até meados do século XX, havia uma intensas caça às baleias e isso quase as exterminou. Países como a Noruega e o Japão, que até hoje ainda permitem a  caça a esses animais, disputavam aquela região para exercer essa prática abominável.  No último dia na Antártica, passamos pela Ilha da Decepção, que leva esse nome, pois antigos navegadores acreditavam ali piratas terem escondido ouro, onde há praias repletas de pinguins de várias espécies, focas e leões-marinhos. A ilha é formada por um vulcão, cuja erupção, em 1967, provocou estragos nas estações de pesquisa argentinas, chilenas e britânicas, eternos rivais na disputa pelo controle dessa área. Voltamos pelo famigerado Canal Drake, que fez o navio mexer bastante, diferente da ida, até chegarmos a Stanley, capital das Falklands, ou Malvinas, para os argentinos.

   Apesar de ter condições atmosféricas extremas, como frio intenso e persistente, ventos fortes, tempestades de neve e umidade do ar baixíssima, sendo considerada o maior deserto do mundo, a Antártica é a maior reserva de água doce do Planeta. Possui uma população temporária entre mil pessoas, no inverno, e  quatro mil, no verão, formada, em sua maioria, por pesquisadores que atuam na exploração científica da região. A atividade de pesquisa e a gestão do espaço físico do continente são feitas mediante o Sistema do Tratado da Antártica, criado em 1959 e conta, atualmente, com 56 países signatários. O cumprimento dos acordos previstos no documento e assinados posteriormente é de fundamental importância para a manutenção do continente, também ameaçado por problemas ambientais, como o aquecimento global. É necessário destacar que existem reivindicações territoriais por diferentes países sobre o continente antártico. Embora haja uma divisão informal, essas áreas reclamadas não são oficialmente reconhecidas pela comunidade internacional. A Antártica é, ou deveria ser, pela primeira vez, na história da humanidade, uma terra de todos e, talvez, quando tudo estiver destruído no restante do Planeta, será a última morada dos remanescentes terráqueos.